Dando continuidade ao artigo que trata da "relação Carlsen + nimzo-índia" veremos mais uma bela partida jogada pelo campeão mundial. Já dissemos no primeiro artigo que a nimzo-índia é a melhor resposta contra 1.d4, na minha opinião, (seguido de"c4", "Cc3", obviamente), pois permite que as pretas escolham a maneira que querem utilizar a defesa, se numa luta estratégica sólida ou num combate aberto, mas sempre com características posicionais. A nimzo-índia é a razão pela qual os GMs atuais estão jogando quase sempre 3.Cf3. Na partida seguinte, as pretas darão uma verdadeira aula estratégica. Veremos "fraqueza nos peões da ala da dama", "bispo mal", "utilização da terceira fila para atacar e/ou defender", "peões passados", "posto avançado", etc...
Quando se tornou campeão mundial de xadrez, em 2013, o norueguês Magnus Carlsen apenas confirmou o que todos já esperavam. Sua superioridade era enorme e ele vencia torneios seguidamente demonstrando um xadrez que o público não estava mais acostumado a ver. Partidas longas, 5, 6 horas de duração, vitórias em finais "empatados", altíssimo nível técnico, etc... Porém, a grande curiosidade na maneira de jogar do Carlsen reside nas suas aberturas. Jogar a escandinava com 3-...Dd8?! ou ressuscitar a Ponziani nos torneios da elite do xadrez mundial realmente não eram coisas corriqueiras, longe disso!! Dentre todas as aberturas que o Carlsen joga tem uma que se encaixa perfeitamente no seu estilo de jogo: a nimzo-índia! Na minha opinião, a nimzo-índia é a melhor resposta contra 1-d4 (apesar de não jogá-la). É uma defesa sólida, não leva a posições super agudas, como a Grunfeld, por exemplo, e tem excelentes perspectivas para as pretas buscarem a vitória sem se expor.
Nessa primeira parte veremos uma das primeiras partidas de Carlsen com a nimzo-índia, disputada em 2001. Na época ele tinha apenas 10 ou 11 anos de idade e um rating de 2072! Apesar da pouca idade, a partida foi duríssima e o seu adversário, o GM Giorgi Kacheishvili teve muito trabalho para vencer.
1. d4 Nf6 2. c4 e6 3. Nc3 Bb4 4. Qc2 O-O 5. a3 Bxc3+ 6. Qxc3 b6 7. Bg5 Bb7 8.
e3 c5 9. dxc5 bxc5 10. Ne2 {Curiosamente, 6 anos depois, Carlsen jogou essa
mesma posição (porém, com as brancas) e perdeu para o GM Yannick Pelletier} Nc6
11. Ng3 Qa5 12. Bxf6 (12. Qxa5 $5 Nxa5 13. b4) 12... gxf6 13. Qxa5 Nxa5 14. Nh5
{Ok, as brancas ganharam um peão, mas Carlsen estava atento às fraquezas na
ala da dama das brancas, típicas nessa linha.} Rfd8 15. O-O-O $6 {Ops! Depois
disso as pretas terão ótimas chances de contra-ataque. Melhor seria 15-b4!?}
Kf8 16. Nxf6 Ke7 17. Nh5 (17. Nxh7 $6 f6 {E o cavalo teria alguns problemas
pra sair de h7...}) 17... Ba6 $1 {Aí está! As pretas recuperam o peão com
grande centralização de peças, além de colunas abertas em ambos os flancos.}
18. Nf4 Bxc4 19. Bxc4 Nxc4 20. Rhe1 Rab8 21. Re2 d5 22. Rc2 Na5 23. Kb1 c4 24.
Ne2 Nb7 {Talvez fosse um pouco melhor aqui impedir que as brancas joguem 25-e4
com 24-...Cb3, para tentar manter a estrutura central.} (24... Nb3 25. e4 dxe4
26. Rxd8 Rxd8 27. Ka2 (27. Rxc4 $4 Nd2+ $19)) 25. e4 $1 Nc5 26. exd5 Rxd5 (
26... exd5 $2 27. Nf4 $16) 27. Nc3 Rg5 (27... Rd3 $1) 28. f4 Rh5 29. Rd4 Rxh2
30. Rxc4 Nd3 31. Ka2 Rb7 32. Ne4 Rd7 33. Nc5 Nxc5 34. Rxc5 Kf6 {Carlsen
continua com uma boa posição, as brancas tem debilidades em "g2" e "f4" e a
maioria das brancas na ala da dama não tem tanta facilidade para se impor.} 35.
Ra5 Rb7 36. f5 e5 37. Re2 Re7 $6 (37... h5 38. Raxe5 Rxg2 39. Rxg2 Kxe5) 38.
Ra6+ Kg5 (38... Kxf5 $4 39. g4+ Kxg4 40. Rxh2) 39. f6 Rb7 40. Rxe5+ Kg6 41. Re7
Rb8 42. Raxa7 $6 (42. Re2 {Fritz 14}) 42... Rxg2 43. Rab7 Rxb7 44. Rxb7 h5 45.
a4 Rg4 46. Ka3 h4 47. Rb8 Rg3+ 48. b3 Kxf6 (48... Rg5 {Com ideia de um
possível apoio ao peão com ...Th5. Finais de torres são sempre cheios de
sutilezas e muito difíceis de jogar.}) 49. Rh8 Kg5 50. a5 Re3 51. Ka4 Re6 $4 {
O erro decisivo. A questão aqui é que ...Th6 não funciona. Provavelmente, após
as sequências "corretas", ambas as torres teriam que se sacrificar e então às
pretas restava a esperança de chegar a um final com seu peão em "f2" contra a
dama branca, que seria empate.} (51... f5 $5) (51... Re1 $5) 52. b4 f5 53. b5
Re1 54. a6 $6 {Erro do GM dessa vez! 53-b6! seria o lance correto. Agora as
pretas voltam ao jogo.} (54. b6 $1 Rb1 55. Rh7 f4 56. b7 Kg6 57. Rxh4 Rxb7 58.
Rxf4 Rb8) 54... Ra1+ 55. Kb4 f4 56. Kc5 f3 57. b6 Ra5+ 58. Kd4 Rxa6 $4 {Agora
já era... Mas, perdoem a criança. :)} (58... f2 $1 $11) 59. b7 Rb6 60. b8=Q
Rxb8 61. Rxb8 Kf4 {O problema aqui é que rei das brancas está muito próximo...}
62. Rf8+ Kg3 63. Ke3 {As pretas se renderam. Essa partida mostra como, desde
criança, o Magnus Carlsen já demonstrava uma enorme compreensão do xadrez, e
como maneja bem a Nimzo-índia! Só para acrescentar uma estatística: na minha
base de partidas tem 53 partidas do Carlsen usando a Nimzo-índia com as negras:
ele venceu 17, perdeu 8 e empatou 28! Uma verdadeira muralha!} 1-0
Dando sequência ao artigo iniciado ontem, hoje veremos como as pretas devem jogar essa variante. Já sabemos que o posicionamento do bispo preto em "c6" atrasa bastante o lance temático da francesa "c5", e sabemos também que a estrutura "a7-b7-c6-e6-f7-g7-h7" é bastante sólida mas, por abandonar a luta pelo centro (ausência do peão "d5"), proporciona às brancas uma boa vantagem de espaço. Ao contrário do que muita gente pensa, nas posições super sólidas o jogador que possui menos espaço deve jogar com muita força e precisão para anular a iniciativa do adversário. Estratégias de "espera" não costuma funcionar nesses casos. Normalmente, o preto nessa variante está buscando sua vantagem na transição meio-jogo---->final, onde sua melhor estrutura de peões ou seu contra-ataque ganham mais força. Na partida abaixo veremos uma das melhores opções para as pretas nessa variante (...Bb5!?) PGN result
Durante a preparação para os JEJs (jogos escolares da juventude), nesse ano, em Brasília, eu e meu amigo-aluno Marco Antônio Sena enfrentamos um difícil dilema: o que jogar contra 1.e4?? Em outra época isso não seria problema, pois, Marco estava "afiado" e chegou a ter 4 treinadores (!!), porém, faz mais de 1 ano que ele não treina... Precisávamos de algo "prático e simples", se é que existe isso. Depois de muita discussão, eis que surgiu a ideia de "desenterrar" uma variante da francesa que, apesar de ser sólida e interessante, praticamente não se joga mais. Uma variante, que de tão sólida é chamada por alguns de "fort knox"!! A ideia é muito simples, resolver o problema do "bispo mal" via d7-c6, trocá-lo pelo Cf3 (ou e4), ou pelo bispo branco e logo em seguida jogar "c6", com uma posição super sólida. Claro, nesse tipo de posição é mais difícil jogar pra ganhar (eu, particularmente, acho que em todas as posições dá pra jogar pra ganhar... Enfim..), mas pra quem não tem tempo para estudar a Najdorf, por exemplo, acaba sendo uma opção interessante. Obviamente você pode tentar jogar a Najdorf sem muito estudo, te desejo boa sorte e que você dure mais do que 20 lances... Nessa primeira partida veremos o que as pretas não devem fazer quando jogarem essa variante.
Existem algumas diretrizes gerais que podem nos orientar para jogar corretamente os finais de partidas, ou pelo menos para fazê-lo seguindo um curso. Certa vez algum forte jogador falou que "é melhor ter um plano ruim do que não ter plano". Acho que o que ele estava tentando dizer é que as conseqüências negativas de caminhar sem um mapa em uma partida de xadrez são maiores do que as de fazê-lo com um mapa não muito preciso. E, particularmente, nos fins, isso é muito visível, apesar de achar que há muita subjetividade nessa afirmação, mas a ideia do artigo não é estimular o debate filosófico! Vamos começar! Como você pode jogar melhor nos finais? Em 90% dos casos, para ganhar um final, você deve coroar um peão ou atacar os peões fracos do seu oponente. Portanto, nos finais, é muito importante ter um bom conhecimento das estruturas dos peões e dos tipos de peões fracos. Em geral, os peões fracos são aqueles que não podem ser defendidos por outros peões, e quanto mais avançados são, mais fracos ficam. Portanto, um peão preto isolado na casa e4 (da perspectiva das brancas) será considerado mais fraco do que se estivesse na casa "e7", por exemplo.
Para que este conceito seja claro, veja o diagrama anterior. Todos os peões marcados em vermelho são fracos por diferentes motivos: Peão isolado em b5; Peão atrasado em d6; Peões dobrados em h7-h6... Além desses peões fracos, existem outros como, por exemplo, os peões "colgantes". Quando dois peões estão juntos, lado a lado, porém separados do restante dos peões, eles se chamam "peões colgantes" e são considerados uma fraqueza nos finais, pois, o avanço de qualquer um deles enfraqueceria o outro. Como regra geral, optaremos pela estratégia de atacar os peões fracos do nosso adversário se não tivermos a possibilidade de usar a estratégia de apoiar um peão passado. Reitero algo que ouvimos em diversas ocasiões: o xadrez está cheio de exceções, mas as regras que discutimos aqui funcionarão na grande maioria dos casos. Vejamos o seguinte exemplo:
Posição para análise. Jogam as brancas. Na posição acima existem "dicas" de como proceder. Criar uma fraqueza no campo do oponente ou na estrutura de peões é fundamental se as brancas buscam a vitória (claro que as pretas também querem vencer, mas a possibilidade disso acontecer, nessa posição, é bem pequena, portanto, devem lutar para igualar) Antes de atacá-los, teremos que fixá-los (evitar que se movam) e, mais tarde, capturá-los sem trocá-los por nossos peões (isto é, capturá-los gratuitamente). É por isso que, para fixar os peões inimigos, usaremos nossos peões, mas para capturá-los, usaremos nossas peças, e mesmo em muitas ocasiões, o rei que, no final, se torna um importante ataque. A técnica de isolar uma fraqueza antes de atacá-la é válida em qualquer fase do jogo e está intimamente relacionada com outra: "a ameaça é mais forte do que a execução", outra das máximas que devemos ao grande Nimzowitsch. A razão é que a ameaça de uma ação pode empurrar seu oponente em uma determinada direção, mas a execução da ameaça também pode causar problemas para você. Voltando à posição acima, qual o plano que você jogaria com as brancas? Análise da partida em breve!!
Todos os enxadristas que estudam o jogo sabem que os finais de torres são os que acontecem com maior frequência. No vídeo abaixo, o MF Luís Fernandez Siles explica, de maneira simples e muito didática, como devemos conduzir esse tipo de final. A videoaula é em espanhol, mas dá pra compreender perfeitamente devido à pronúncia clara do instrutor e também porque o vocabulário é bem repetitivo com algumas palavras que fazem parte das lições de xadrez.